O segundo acto começa precisamente como o primeiro. Os actores devem ocupar no início deste acto as mesmas posições que ocupavam no primeiro, a fim de os espectadores compreenderem não se tratar esta semelhança dum acidente ocasional. ( nota à margem)
O tom é profético e a voz triste.
Está a falar sozinha. Já o estava, possivelmente, antes de surgir no palco.
Fala com amor.
Ao abrir o pano a cena está às escuras. Uma única personagem, intensamente iluminada, encontra-se à frente e ao centro do palco. É o popular que deu início ao primeiro acto.
Manuel
Que posso eu fazer? Sim, que posso eu fazer?
(Dá dois passos em direcção ao fundo do palco. Detém-se.)
Sempre que há uma esperança os tambores abafam-lhe a voz...
Sempre que alguém grita os sinos tocam a rebate...
(Pausa)
E cai-nos tudo em cima: o rei, a polícia, a fome...
(Levanta os braços ao alto)
Até Deus!
(Deixa cair os braços num gesto de desânimo)
E ficamos pior do que estávamos... Se tínhamos fome e esperanças, ficamos só com fome... Se, durante uns tempos, acreditámos em nós próprios, voltamos a não acreditar em nada...
(...)
(Para o palco)
Que mais sabem vocês da prisão do general?
Ilumina-se o fundo do palco, que se encontra repleto de gente do povo disposta exactamente como para a cena de abertura do 1º acto.
(...)
O Antigo Soldado
(visivelmente acabrunhado)
Prenderam o general... Para nós, a noite ainda ficou mais escura...
1º Popular
É por pouco tempo, amigo. Espera pelo clarão das fogueiras...
(...)
(Rita sai. Surge, a meio do palco, intensamente iluminada e sentada numa cadeira tosca, Matilde de Melo – uma mulher de meia-idade, vestida de negro e desgrenhada)
Matilde
Ensina-se-lhes que sejam valentes, para um dia virem a ser julgados por covardes!
Ensina-se-lhes que sejam justos, para viverem num mundo em que reina a injustiça!
Ensina-se-lhes que sejam leais, para que a lealdade, um dia, os leve à forca!
(Levanta-se)
Não seria mais humano, mais honesto, ensiná-los, de pequeninos, a viverem em paz com a hipocrisia do mundo?
(Pausa)
Quem é mais feliz: o que luta por uma vida digna e acaba na forca, ou o que vive em paz com a sua inconsciência e acaba respeitado por todos?
(Encaminha-se para uma cómoda velha que surge, iluminada, à sua esquerda)
Se o meu filho fosse vivo, havia de fazer dele um homem de bem, desses que vão ao teatro e a tudo assistem, com sorrisos alarves, fingindo nada terem a ver com o que se passa em cena!
Luís de Sttau Monteiro, Felizmente Há Luar!
1.Enquadre este excerto na estrutura externa e interna da obra.
2. Tendo em conta a globalidade da obra, refere a importância de Manuel na economia da obra.
3. Explique as funções que a iluminação desempenha no texto.
4. Refira o que simboliza a expressão «noite escura» proferida pelo Antigo Soldado.
5. Matilde aprendeu uma lição com a condenação de Gomes Freire.
5.1. Destaque o essencial dessa lição.
5.2. Indique quem Matilde designa ironicamente por «homens de bem».
6. Identifique dois recursos expressivos presentes no texto e diga qual a sua expressividade na determinação da respectiva mensagem.
7. A partir das didascálias laterais, prova que Felizmente há Luar! está de acordo com os princípios do teatro épico.
B
Em Memorial do Convento também há uma crítica aos meios e métodos de aplicação da (in)justiça, em tudo semelhante à que é feita ao poder do regime totalitário em Felizmente, há luar!
Num texto expositivo-argumentativo entre 100 e 150 palavras, faça uma dissertação sobre o poder do regime absolutista e da inquisição, alvo de denúncia no romance de Saramago.
II
Leia o texto:
A Revolução de 25 de Abril de 1974 representa o início de uma nova era no Teatro português, estrangulado por 40 anos de obscurantismo e Censura. Nos anos imediatos à revolução foi um teatro à procura de um diálogo com o seu tempo. O realismo social estava na ordem do dia, ligado à tomada de posições políticas; mas paralelamente era também um espectáculo à procura de um público, e de um modelo de criação.
A proliferação de grupos de teatro independente característica destes anos, permite ao teatro português consolidar a sua posição no meio artístico, através de uma grande diversidade de estéticas e de públicos. Estas novas entidades congregavam, maioritariamente, jovens profissionais, alunos oriundos do novo Conservatório, actores do teatro universitário ou jovens saídos de cursos ministrados por convidados estrangeiros que então visitaram Portugal. A estas estruturas se ficaria a dever, em grande parte, a abertura de novos percursos no teatro, a afirmação de diversificados repertórios ou a procura de conceitos diferenciados de direcção e encenação.
A partir de meados dos anos 80, começam-se a esboçar noções como a de marketing cultural, gestão teatral, e «artes performativas». Assiste-se à redefinição do panorama teatral, caracterizada pela institucionalização da segunda geração de independentes, e ao aparecimento de uma novíssima geração de rebeldes, que embora muito diferentes entre si, têm em comum um teatro assente na palavra, na encenação, e na imagem e carisma do actor. A partir da década de 90 o teatro português vê alargar o seu espectro de criadores. Surgem novas estéticas, muito ligadas à multiplicação dos Festivais de Teatro, e aos contactos com companhias estrangeiras convidadas.
1. Indica se as afirmações são verdadeiras ou falsas, escrevendo na sua folha de teste a alínea seguida de V ou F.
Afirmações
a) “A Revolução de 25 de Abril de 1974...(1) tem uma referência mais lata que “Nos anos imediatos à revolução...” (2)
b)“Estas novas entidades ...” (8) recupera a referência já feita a “grupos de teatro” (6).
c) “A estas estruturas ...” (10, 11) recupera a referência a “diversidade de estéticas e de públicos...”(7,8)
d) “diversificados repertórios ou a procura de conceitos diferenciados de direcção e encenação .(12) não tem referência anterior.
e) “A partir de meados dos anos 80” (13) e “A partir da década de 90” (17) é um mecanismo de coesão interfrásico.
f) “geração de independentes ...” (15) e “geração de rebeldes (16) “ passa-se de uma modalização neutra para uma valorativa.
2. Neste item, faça corresponder a cada um dos quatro elementos da coluna A um elemento da coluna B, de modo a obter afirmações verdadeiras. Escreva na sua folha de respostas, ao lado do número da frase, a alínea correspondente.
A B
1) “mas paralelamente era também um espectáculo...” (4)
2) “que então visitaram Portugal ...”(10)
3) “A estas estruturas se ficaria a dever...” (13)
4) “começam-se a esboçar noções..” (13)
a) é uma oração subordinada relativa sem atecente.
b) é um pronome pessoal indeterminado.
c) é aparentemente uma oposição mas acaba por ser a conciliação com uma ideia nova.
d) é uma oração subordinada completiva.
e) é uma oração subordinada relativa com antecedente.
f) é um pronome pessoal complemento indirecto.
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